domingo, 30 de novembro de 2008

Bansky é animal! (no bom sentido)







Bansky é um artista misterioso. Ninguém sabe quem ele é. Ninguém conhece sua cara. Ninguém sabe se é homem ou mulher. Bansky pode estar ao seu lado agora.

E Bansky fez uma genial exposição em Nova York em outubro. Não numa galeria, mas sim numa loja de produtos para animais, The Village Pet Store and Charcoal Grill na 89 West 7th Avenue.

Por fora, uma pet shop comum, sem nenhum aviso da exposição, onde você poderia entrar para comprar ração para o seu cachorro. Dentro uma inusitada mostra com animatronics sobre a nossa relação com os animais.

Por exemplo, ao invés de pintos comendo grãos, nuggets em movimento bebericando molho barbecue. Ou honey mostard, se você prefere.

Noutra “jaula”, o que parece ser uma onça repousando sobre um galho e balançando o rabo, é, quando se chega perto, uma bolsa feita com a pele do animal.

Há também o personagem de história em quadrinhos, o Piu-piu (Tweety) envelhecido e deprimido após tantos anos preso em uma gaiola. Exatamente como o seu canário.

Há ainda as iscas de peixe fritas, à milanesa, nadando dentro de um aquário; a coelha que se enfeita diante da penteadeira; o macaco com fones de ouvido, assistindo a um documentário do Discovery Channel sobre primatas; o camaleão que se camufla em um muro grafitado.

Os animais são, claro, artificiais, e a exposição foi muito criativa não só em forma e conteúdo, como também na utilização do espaço expositivo. Infelizmente, eu não estive lá, in loco, mas dá para dar um google e encontrar fotos e vídeos sobre a exposição.

Os organizadores incentivavam que o público levasse câmeras para depois espalhar o trabalho na web. A exposição ficou 20 dias em cartaz, aberta de 10 da manhã à meia-noite, com entrada franca, e teve grande sucesso na base do boca a boca. E do olho na internet.

Instinto selvagem

Os americanos têm a tradição da Black Friday, sexta-feira após o Dia de Ação de Graças quando o varejo costuma abrir as portas oferecendo enormes descontos e dando o pontapé inicial para as compras natalinas.

Nesta sexta, 28/11, um funcionário temporário da Wal-Mart, morreu pisoteado pela multidão em Long Island, Nova York, quando as portas da loja se abriram às 5h da manhã.

Não era uma turba de famintos lutando desesperadamente por um prato de comida que poderia significar a diferença entre a vida e a morte.

Eram pessoas com necessidades básicas atendidas querendo consumir supérfluos.

Isso é civilização ou barbárie?

Black Friday. Black. Luto.

Compre batom

Imagem: Target Boy. Origem: diganaoaerotizacaoinfantil.files.wordpress.com.
A propaganda é muitas vezes vista como vilã que catequisa mentes inocentes rumo ao consumo desenfreado. Não é bem assim. É claro que a propaganda é influenciadora de comportamentos, mas ela é apenas uma das influenciadoras e nem é a mais poderosa. Vale sempre lembrar que a propaganda não tem nenhum caráter revolucionário, transformador. Propaganda não é vanguarda moral. Ao contrário, ela costuma refletir os valores da sociedade. A propaganda lê os valores sociais, reprocessa e devolve embalado em comerciais de 30 segundos. Ao fazer isso, ela legitima e reafirma esses valores. É preciso primeiro mudar algo na sociedade para que gradualmente a propaganda absorva esses novos valores. Por isso, há um certo exagero e uma certa tolice em demonizar a propaganda.

Hoje, muitos pais de classe média e alta substituem presença e afeto por fast-food e shopping. Criam uma geração de reizinhos mimados, cheios de vontades, que querem tudo ao mesmo tempo agora. Os pais sentem-se culpados por não estarem tão próximos aos filhos e para aliviar a consciência, enchem as crianças de presentes e coisas. Mas as necessidades infantis são muito menos materiais do que afetivas e orientadoras. Crianças são criadas pela babá eletrônica, a TV. Crianças que, lamentavelmente, se erotizam cedo demais e perdem a infância. Crianças que não brincam mais de pique e ficam obesas diante da TV e do computador.

O consumismo exagerado, o “tenho, logo existo”, o “preciso ter para ser”, é só a ponta de uma doença social mais ampla e de diversas causas. Em suma, a propaganda não é o Darth Vader, não é a Odete Roittman dessa história. Claro que também não é nenhuma santa. Assim como nós não somos.

Sobre publicidade para crianças, repasso duas dicas que recebi do amigo, também do ramo, Wagner Pinheiro. Uma delas é o documentário “Criança, a alma do negócio”, dirigido por Estela Renner e Marcos Nisti, cujo trailler de 4’58 está disponível no youtube. http://www.youtube.com/watch?v=rW-ii0Qh9JQ

A outra é o blog http://criancasemidia.blogspot.com/, mantido por Elisa Araújo, que estimula reflexões oportunas para quem se interessa mais pelo tema.

Mas e o que diz o Conar, o Conselho Nacional de Auto-Regulamentção Publicitária? O Conar dedica a seção 11 do seu Código à publicidade para crianças. Leia a seguir e me diga se é cumprido ou são letras mortas?

“SEÇÃO 11 - Crianças e Jovens
Artigo 37 - Os esforços de pais, educadores, autoridades e da comunidade devem encontrar na publicidade fator coadjuvante na formação de cidadãos responsáveis e consumidores conscientes. Diante de tal perspectiva, nenhum anúncio dirigirá apelo imperativo de consumo diretamente à criança. E mais:
I – Os anúncios deverão refletir cuidados especiais em relação a segurança e às boas maneiras e, ainda, abster-se de:
a) desmerecer valores sociais positivos, tais como, dentre outros, amizade, urbanidade, honestidade, justiça, generosidade e respeito a pessoas, animais e ao meio ambiente;
b) provocar deliberadamente qualquer tipo de discriminação, em particular daqueles que, por qualquer motivo, não sejam consumidores do produto;
c) associar crianças e adolescentes a situações incompatíveis com sua condição, sejam elas ilegais, perigosas ou socialmente condenáveis;
d) impor a noção de que o consumo do produto proporcione superioridade ou, na sua falta, a inferioridade;
e) provocar situações de constrangimento aos pais ou responsáveis, ou molestar terceiros, com o propósito de impingir o consumo;
f) empregar crianças e adolescentes como modelos para vocalizar apelo direto, recomendação ou sugestão de uso ou consumo, admitida, entretanto, a participação deles nas demonstrações pertinentes de serviço ou produto;
g) utilizar formato jornalístico, a fim de evitar que anúncio seja confundido com notícia;
h) apregoar que produto destinado ao consumo por crianças e adolescentes contenha características peculiares que, em verdade, são encontradas em todos os similares;
i) utilizar situações de pressão psicológica ou violência que sejam capazes de infundir medo.
II - Quando os produtos forem destinados ao consumo por crianças e adolescentes seus anúncios deverão:
a) procurar contribuir para o desenvolvimento positivo das relações entre pais e filhos, alunos e professores, e demais relacionamentos que envolvam o público-alvo;
b) respeitar a dignidade, ingenuidade, credulidade, inexperiência e o sentimento de lealdade do público-alvo;
c) dar atenção especial às características psicológicas do público-alvo, presumida sua menor capacidade de discernimento;
d) obedecer a cuidados tais que evitem eventuais distorções psicológicas nos modelos publicitários e no público-alvo;
e) abster-se de estimular comportamentos socialmente condenáveis.
§ 1º Crianças e adolescentes não deverão figurar como modelos publicitários em anúncio que promova o consumo de quaisquer bens e serviços incompatíveis com sua condição, tais como armas de fogo, bebidas alcoólicas, cigarros, fogos de artifício e loterias, e todos os demais igualmente afetados por restrição legal.
§ 2º O planejamento de mídia dos anúncios de produtos de que trata o inciso II levará em conta que crianças e adolescentes têm sua atenção especialmente despertada para eles. Assim, tais anúncios refletirão as restrições técnica e eticamente recomendáveis, e adotar-se-á a interpretação a mais restritiva para todas as normas aqui dispostas.
Nota: Nesta Seção adotaram-se os parâmetros definidos no art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90): “Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.”

Para finalizar, a célebre campanha do chocolate que dá título a esta postagem, está listada entre os 34 casos de propaganda para crianças que foram apreciados e constam no site do Órgão. O parecer? “A nosso ver, é suficientemente claro na publicidade o aspecto caricatural da hipnose. Ela não dá a impressão de mais do que uma espécie de paródia de hipnotização. As crianças demonstram estar conscientes de que participam como atores em uma comédia.”

Zezão

Trabalho de Zezão. Foto: Divulgação


Acesse http://www.artesubterranea.com/ e conheça o trabalho de Zezão, pintor abstrato que mistura técnicas tradicionais a ferramentas alternativas, como o spray.

É arte urbana na veia, múltiplas linguagens contemporâneas e estilo próprio. Além de intervenções em cenários underground – como as margens do Tietê, canais de águas pluviais, subterrâneos, imóveis abandonados ou semi-destruídos, embaixo de viadutos – Zezão também já fez trabalhos para marcas como Skol e Colcci.


De 29 de novembro a 24 de dezembro, acontece a exposição “Zezão, fotógrafo” na galeria Choque Cultural, em Sampa, focada em street art. A galeria fica na Rua João Moura, 997.

Vale a visita!

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Ousadia ou falta de ética?


O texto a seguir foi extraído - com a devida autorização - do blog http://www.novaadvocacia.blogspot.com/, mantido pelo profissional de marketing e professor Robson Vitorino.

Não é fácil achar boa bibliografia sobre ações de marketing para um nicho específico de mercado, como escritórios de advocacia. Além do mais, ética e propaganda têm sempre espaço na pauta do Mar de coisa. Então, para meus leitores que fazem Direito e para os que querem aprender a fazer direito, segue o texto.


"Ousadia ou Falta de Ética?
Ao chegar hoje pela manhã no centro do Rio de Janeiro, eu estava me dirigindo ao escritório de um cliente e quando cheguei à portaria do prédio fui saudado com um bom dia muito simpático por uma moça, aparentando ter uns 25 anos no máximo, bem arrumada, e que me deu um informativo impresso de um escritório de advocacia, que por motivos óbvios não irei mencionar aqui no blog.

A primeira idéia que me veio à mente foi a ousadia de realizar uma ação como essa, uma vez que é explicitamente uma ação da captação de clientela. Depois desse choque, me veio imediatamente a idéia do desperdício, pois no andar em que fica o escritório do meu cliente, havia na lixeira vários informativos do "tal" escritório.

Por fim, tentando me colocar no lugar dos autores desta ação deduzi que eles, estariam convencidos de que precisavam fazer algo para posicionar o escritório, para se tornarem mais percebidos pelos seus clientes com vistas a novas demandas, praticaram uma espécie de marketing do desespero.

Faço questão de escrever sobre isto não com o objetivo de falar mal da ação desse escritório, mas simplesmente para chamar a atenção para ações denominadas de "marketing", mas que de marketing não tem nada e, por fim, consomem recursos, e não geram o retorno esperado. Com certeza não geram o retorno esperado!

Amigos, independente do Código de Ética, a advocacia não é um serviço que tenha a característica de produtos e serviços de varejo, e jamais poderá ser apresentada desta forma. Embora o informativo estivesse com layout bem apresentável, faltou fazer a lição de casa e segmentar esta ação. Quais clientes valorizam e se interessam por este tipo de informação? Estamos na era da informação e, para darmos um tiro certeiro, precisamos enviar informação qualificada para o público certo. Portanto, é preciso agrupar os clientes por grupos de afinidades (atividade, porte, localização, etc.), e enviar informativos personalizados por grupos de interesses, para se evitar o desperdício de recursos, o desgaste da marca do escritório, e a geração de desconforto para quem recebe um informativo sobre o qual não tem nenhum interesse.

O informativo poderia ser feito em formato eletrônico? Provavelmente sim, mas isso quem deve decidir é o cliente. Como ele prefere receber os informativos? Este é um tempo de forte consciência ambiental, e o escritório deve atentar para isto, optando por reduzir custos com impressão. Se o seu cliente preferir o formato impresso, busque imprimir em papel reciclado.

Em relação à captação de novos clientes, de forma ética, eu buscaria num primeiro momento intensificar a relação do escritório com clientes estratégicos, com recente histórico de resultados favoráveis. Solicitaria a esses indicações de outros escritórios, e a permissão para a citação dos seus nomes. É claro que deve haver uma crítica quanto ao perfil do cliente, para certificação se está dentro do perfil desejado pelo escritório. Clientes bem atendidos geralmente têm o prazer de indicar aos amigos os seus advogados ou o escritório que lhes atendem.

É tempo de rever as estratégias, principalmente aquelas que não sabemos ao certo se darão ou não retorno mas que, certamente, demandam investimentos razoáveis. "

© Robson Vitorino
http://www.novaadvocacia.blogspot.com/ (postado em 25/11/2008)

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Bumbum e rosas

Peça decorativa no estúdio de tatuagens Supernova (RJ). Foto: Leandro Wirz

Excentricidades nas exigências dos astros pop são esperadas. Até estranhamos quando alguma estrela não pede nada além de 200 toalhas brancas para o camarim. Ou quando pedem mais água mineral do que garrafas de scotch.

Mas sempre é possível surpreender. E Madonna, em todos os sentidos, é boa nisso. Ente as exigências para sua estada no Brasil estão assentos novos em todos os banheiros. Até aí, ok, ela não vai sentar seu derrière em qualquer lugar, ainda que tenha sido devidamente desinfetado.

Mas Madonna avisa que as tampas dos vasos serão levadas embora com ela. Será coleção? Ou será que ela tem receio de que algum doido resolva leiloar na internet a preciosa relíquia? O assento onde Madonna sentou sua bundinha musculosa para fazer...
Uma preciosidade! Produto genuíno! La garantia soy jo.

Tia Elton John (alô, patrulha, o emprego do termo “tia” aqui é afetuoso e não pejorativo), que vem ao Brasil em janeiro, já avisou que quer toalhas de linho brancas sobre as mesas e sete vasos quadrados com rosas, sendo cinco vermelhas e duas brancas, todas sem folhas.

Lembro de uma entrevista que assisti de Sir Elton John no programa do David Letterman. Perguntado sobre o que queria ouvir de Deus quando chegasse ao céu, John, bem humorado, respondeu: “Bem-vindo, sua bicha velha!”.

Adoro Elton John desde o início dos anos 1970. Ele compôs – quase sempre com o letrista Bernie Taupin, em uma das mais bem sucedidas, produtivas e duradouras parcerias do pop - muito mais ótimas canções do que as baladas açucaradas que entupiram as FMs nas últimas três décadas. Mas não sei se vou ao show. Ninguém merece James Blunt abrindo.

O mundo é péssimo


No Brasil para inaugurar a exposição “A Consistência dos sonhos” e lançar o livro “A viagem do elefante” (Cia das Letras), o escritor José Saramago falou à imprensa no Consulado de Portugal em São Paulo, na tarde de 25 de novembro:

“Não sou pessimista, o mundo é que é péssimo. Nessa longa história da humanidade, em que ponto tomamos uma direção errada que nos levou ao desastre que estamos hoje, do qual somos responsáveis? A literatura pode salvar o mundo? Mas salvar o mundo como? Principalmente depois de tudo o que já se escreveu. Como não conseguimos mudar o rumo de nossas vidas?

Quantos delinqüentes existem no mundo? A violência já atingiu o nível da barbárie. A corrupção chegou a tal ponto que é um problema de linguagem. A palavra bondade hoje significa qualquer coisa de ridículo. É preciso conquistar, triunfar. Ninguém se arrisca a dizer que seu objetivo é ser bom. Querer ser bom em uma época como esta é se apresentar como voluntário para a eliminação. Como chegamos a isso? Para mudarmos a vida, é preciso mudarmos de vida”.

Colhi estas declarações no site do jornal O Globo, em matéria assinada pela jornalista Márcia Abos.

E as palavras de Saramago me fizeram pensar em outras tantas. Também tenho muito mais perguntas do que respostas, e as perguntas talvez nem sejam as certas. Em que ponto tomamos uma direção errada? Acho que foi logo na primeira curva do percurso. Se a fábula bíblica diz que Caim matou o irmão Abel, então somos todos filhos de Caim, o irmão mau. Lendas a parte, há uma cena no filme “Hannah e suas irmãs”, de Woody Allen, em que a personagem questiona como a humanidade foi capaz de produzir uma barbárie como o holocausto dos judeus. Seu interlocutor, mais vivido e amargo, retruca que sendo os homens como são, o que causa perplexidade é só termos cometido isto uma vez. A gente não é flor que se cheire.

Não, não creio que a literatura possa salvar o mundo. Nenhuma arte tem esse poder. No prefácio de “O retrato de Dorian Gray”, Oscar Wilde escreve que “o artista é o criador de coisas belas. A única coisa que salva o artista é a beleza de sua arte. Toda arte é completamente inútil”.

Renato Russo fez um acurado retrato de sua geração nas canções que compôs. Ao final de “Há tempos”, ele canta: “Meu amor, disciplina é liberdade, compaixão é fortaleza, ter bondade é ter coragem. Lá em casa tem um poço, mas a água é muito limpa”. E assim o poeta se apresenta, seja à eliminação, seja à aceitação. Mas seja qual for a consequência, permanece dignamente em pé. Água e consciência limpas. Mesmo no fundo.

Finalmente, lembrei de Millôr Fernandes, genial em seus aforismos irônicos: “O otimista é um pessimista mal informado”.

Então, estou aqui contribuindo para o pessimismo generalizado.

domingo, 23 de novembro de 2008

MMS

Os franceses usam apenas três letras para falar da atividade sexual do homem ao longo da vida: MMS

A freqüência sexual na juventude é Matin, Midi et Soir.

Depois dos 40, é Mardi, Mercredi et Samedi.

Aos 60, Mars, Mai et Septembre.

Aos 80... Mes Meilleurs Souvenirs.

MSN

Poesia em fuga. Instalação no MAC-Niterói. Claudiopartes




Noite dessas, não faz muito tempo, eu estava recebendo casais de amigos e uísque vai, vinho vem, falamos de poesia. Nove entre os onze presentes têm preconceito contra a poesia. Do tipo, se o cara diz que é poeta na noite em que vocês se conhecem, fortíssima probabilidade do cara ser mala.

Sou poeta, todos sabiam, e não tinham a intenção de me agredir. Não creio que precise trocar de amigos. Não os culpo. Ouso dizer que concordo com eles. Para a maioria das pessoas a poesia ou é hermética e incompreensível ou é de um romantismo barato, brega, cafona. E o pior é a empáfia pseudo-intelectual. O sujeito julgar-se cabeça. E avançando na cruel sinceridade, grande parte da poesia produzida é um lixo. O que inclui grande parte da minha própria produção literária. Faço uns gols vez em quando, mas chuto muita bola fora.

Acho ainda que a poesia demanda do leitor mais do que a prosa. Isso torna seu consumo mais árduo. E o fato é que quase todo mundo que lê poesia se arrisca a escrever também, o que torna a poesia uma tremenda ação entre amigos. Nem todos chatos. Por isso, eu valorizo imensamente os meus leitores que eu não conheço. Aqueles que não compraram meus livros por educação.

Minha mãe comprou por uns trocados um livro artesanal de poesia vendido no metrô por um jovem de, segundo ela, “uns dezoito ou dezenove anos”. Ela, que tem coração grande, como convém às mães, comprou o livro por misericórdia. Ela se lembrou de quando eu tinha aquela idade e também fui mala a ponto de vender meus livros de bar em bar, junto com hare krishnas vendendo incenso, senhores vendendo rosas murchas e fotografias em polaróide.Vê-se, que os tempos eram completamente diferentes. Naquela época, não era tão ridículo assim.

Ontem, depois do almoço, minha mãe me mostrou o livro do rapaz. Não apenas por questões éticas é que omito o título do livro e o nome do autor. Não os guardei mesmo.
Folheei as páginas, li alguns poemas e, como minha mãe alertara, é péssimo. Não dá mesmo para ler.

Mas a introdução me chamou muita atenção. O jovem poeta escreveu um curto texto de apresentação no qual afirma que é muito bom o seu trabalho estar recebendo elogios (pergunto-me de quem). E que ele acha que de fato os merece. Porque, palavras dele, escreve “com muita profundidade sobre o amor e a natureza”. A presunção não pára aí. Nos agradecimentos, ele diz obrigado a Deus, a mamãe, a vovó, e a um certo alguém que o incentiva em seu “talento”. Ah, os jovens! MSN: muito sem noção.

Salve Rimbaud, o jovem poeta, o gênio precoce, que chutou o balde da poesia e se mandou para a África.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Logo agora

Pegando o gancho da lista de blogs da Época, replico aqui este ótimo texto publicado no blog Dia a dia, bit a bit, escrito por Silvio Meira (http://smeira.blog.terra.com.br/)

"14.11.08 quem matou a blogosfera?…
tempos atrás, até que havia algum sentido em se usar ciber-espaço pra designar o mundo virtual e internauta pra falar de quem usava a rede. hoje, não mais. todo o mundo é real: uma parte é abstrata [ou virtual] e só existe na rede, boa parte dela simulando processos, funções e serviços que ocorrem na contraparte concreta que costumávamos chamar de mundo físico ou, como os americanos rotularam lá atrás, de bricks. e o ciber-espaço morreu de velho, pois hoje todo o espaço é ciber. da mesma forma, todo mundo está, ou deveria estar, na rede. ser o que se chamava de internauta é a norma, não a exceção, como astronauta é. este sim, é exceção, você não encontra um a cada esquina. tirante nós que estamos, o resto de mundo que não está na rede é um problema a ser tratado, da mesma forma que devemos ir atrás e incluir quem não tem esgoto, água, educação, saúde e eletricidade. e você e eu nunca ouvimos falar de quem tem eletricidade como os "eletrificados". ouvimos? não, claro que não. o título deste artigo vem de um texto de nick carr, que toca o rough type, uma das fontes de informação mais respeitadas que conheço. e a pergunta de nick tem a ver com a consolidação de um modelo de criação, edição e publicação de informação que se tornou possível pela disponibilidade de infra-estruturas, serviços e aplicações que habilitaram, por sua vez, cada um de nós [que quisesse] a ter seu próprio jornal na rede. de repente, todo mundo "virou" jornalista, no muito antigo sentido de um diário escrito por alguém para si e, talvez, os leitores. máquinas virtuais de edição, publicação e relacionamento de conteúdo e pessoas, conectadas no limite da rede [de computadores, empresas, celulares…] pulverizaram os modelos clássicos de literatura, jornalismo e notícias, outrora baseados em críticos, revisores, editores, publishers, distribuidores, casas editoras, bancas e o que mais cabia. e deram lugar a novos modelos de criação, edição e publicação, onde jornalistas [inclusive os das antigas], ao descobrir as novas possibilidades, adaptaram-nas [não sem alguma, e em certos casos, muita demora] aos seus antigos [às vezes, agora, renovados] fins e agendas. e isso era absolutamente previsível, até porque quase a totalidade das dezenas de milhões de blogs no ar não interessa a ninguém além dos cinco amigos e amigas d@
dono@ e alguns dos familiares. exatamente o contrário do blog do noblat, que não é um blog: deveria se chamar noblat news network, de tanta coisa [interessante e relevante] que reporta, comenta e replica. mas… a blogosfera morreu e o artigo de nick carr começa… [Blogging seems to have entered its midlife crisis, with much existential gnashing-of-teeth about the state and fate of a literary form that once seemed new and fresh and now seems familiar and tired…] dizendo que os blogs, outrora inovadoras plataformas de expressão, estão enfrentando uma crise de meia-idade… e acaba dizendo que [Who killed the blogosphere? No one did. Its death was natural, and foretold] a blogosfera morreu de morte morrida; seu fim [como forma inovadora, revolucionária, massiva, de mídia] foi natural e previsível. e eu concordo. a "mídia" [como o terraMagazine] entendeu o recado, descobriu que é bom [e dá audiência] ter textos soltos, leves, irresponsáveis até, em letras minúsculas, na hora em que querem entrar e sobre o que querem falar, sem editor, com a participação dos leitores, reclamando das minúsculas inclusive, dando opinião sobre tudo e todos, fora do contexto muitas vezes. a "mídia" demorou mas absorveu parte da anarquia da periferia e, ao trazê-la pra dentro de casa e reprocessá-la, continou sendo, em boa medida, o mesmo centro que sempre foi. esta é a "morte" da blogosfera a que carr se refere. quer ver ou fazer algo de novo?
vá ver meu twitter [e crie um pra você, talvez]. talvez valha a pena adicionar que nunca fui, ou me senti, "blogueiro", da mesma forma que nunca fui internauta ou "eletrificado". no caso desta coluna informal, me sinto escritor, repórter, jornalista, diarista, colunista, contista, cientista, professor e aluno, denominações que sempre e ainda se aplicam ao que faço há décadas. nós, neste espaço [nada de chamá-lo de virtual, por favor] formamos uma comunidade de leitores e escritores, conectada, em rede, com todas as outras fontes de informação que relacionamos aqui e que nos relacionam de lá. a blogosfera morreu. mas a escrita na rede ainda está nascendo. ainda falta muito pra que se saiba o que estamos fazendo. mas este não é o problema. vamos continuar fazendo e tentando descobrir… que um dia a gente vai acabar sabendo. R. I. P. blogosfera. descanse em paz."

Pô, logo agora que eu cheguei ?!

80 + 1


A revista Época desta semana publicou matéria de capa sobre os 80 blogs imperdíveis, fundamentais. Como acontece em toda lista, as ausências são mais sentidas do que as esperadas presenças.

Todos os quatro ou nove leitores do Mar de Coisa disseram que este blog deveria estar na lista e pensam em boicotar a revista por essa falta. Modéstia às favas, eu concordo.

Aliás, por que 80? E não 100? Ou 2008? Ou 69?


Mutley Marketing


Era uma linda manhã de chuva e eu dirigia para o trabalho. O carro à minha frente trazia adesivos no vidro traseiro que me fizeram querer pará-lo e oferecer meus préstimos em consultoria de marketing.

O nome da empresa estava escrito com letras alternadas em laranja e marinho e não consegui identificar duas vogais na cor escura. O que li era “Podot?n?”.

Abaixo, enorme, havia um adesivo do Mutley igual a este que ilustra este texto. Mutley é o cachorro crápula e cínico, de risada inconfundível, que acompanha resmungando o personagem Dick Vigarista. Ou seja, o mascote “perfeito” para passar uma imagem de confiança, de credibilidade, ao cliente.

Pensei tratar-se de uma pet shop ou algo assim. Mas não. Era uma empresa que comercializa produtos para podologia! Você confiaria a ela seus pés?

Depois dos três telefones para contato, vinha o e-mail, com duas iniciais e o sobrenome “mosqueira”. Amigo, você está comendo mosca...

Consciência


Hoje é feriado em algumas cidades do Brasil. Dia da Consciência Negra.

O Brasil ainda tem muito o que avançar para deixar de ser um país racista. Uma colega comentou que explicaram ao filhinho dela na escola que era o dia dos morenos. Como diria Ancelmo Góis, moreno é o cacete. Com todo respeito. Penso que é preconceito usar a palavra moreno como eufemismo, para não dizer negro. Como também acho que é um exagero descabido da praga do politicamente correto o uso de afro-descendente. Nunca considerei o termo negro pejorativo, nem desrespeitoso. Terei que usar euro-descendente, nipo-descendente?! Negro é bonito.

Vi publicado nos jornais de hoje um anúncio da empresa de limpeza e conservação Novo Rio. A imagem traz um homem branco vestindo uma camiseta branca com os seguintes dizeres estampados: “45% negro, 30% branco, 15% amarelo, 10% índio”. E o texto dizia “Todos nós somos uma mistura de raças. Discriminar alguém por sua cor é discriminar a si mesmo.” Feita a ressalva de que o conceito de raça cientificamente não se sustenta, o anúncio é bacana.

O jornal também traz a notícia de que na onda da Obama mania, “a Comissão de Relações Exteriores da Câmara aprovou a ida de um grupo de deputados afro-descendentes para a posse de Obama”. Não tem a menor necessidade disso. Provavelmente, o Brasil já estará representado na posse por seu Chefe de Estado. Esse avião da alegria é só para beneficiar alguns que farão turismo com o dinheiro público e poderão dizer “eu estava lá num momento histórico”.


Mas esperar que alguns deputados, independente da cor da pele, tenham consciência, talvez seja um pouco demais.

Rio de lama e lixo

Grafite em banca de Ipanema. Foto: Leandro Wirz


“Vem chegando o verão...”, cantava Marina Lima naquele hit chiclete de 20 anos atrás. E com ele, um calor desgraçado, o Aedes Egypt e os típicos temporais da estação.

Eu adoro as chuvas fortes do verão, o céu carregado de nuvens de estanho, os trovões roncando assustadores, os raios rasgando a paisagem, o vento forte fazendo barulho nas árvores e rodamoinhos junto ao chão, os cheiros pré e pós chuva, a luz que entra depois do “toró”, parecendo que o mundo passou em um lava-jato e a vista desembaçou.

Claro que não gosto de ruas alagadas, ratos boiando, barracos desabando nas encostas, pessoas desabrigadas, queda de energia, gente ilhada, língua negra de esgoto desembocando direto na praia etc etc . Já perdi o motor de um carro numa enxurrada. Ao tentar atravessar uma poça acelerando forte em marcha reduzida, o motor deu o tal do calço hidráulico e teve que ir para retífica. Também já encarei um arrastão quando fiquei preso em um engarrafamento na Avenida Brasil, causado pela forte chuva.

Esta semana, começaram os temporais no Rio e instalou-se o esperado caos. A despeito das deficiências na limpeza urbana e da falta de manutenção das galerias pluviais, os principais responsáveis por esses transtornos causados pelos temporais somos nós.

Nós é que somos um povinho porco e mal-educado, que tem o péssimo hábito de jogar lixo na rua entupindo os bueiros e de poluir os rios, jogando neles sofás velhos e garrafas pet de plástico. E aí depois, reclamamos das enchentes, como se não tivéssemos nada a ver com isso.

domingo, 16 de novembro de 2008

Barcelona (10 fotos)













































Barcelona, 2008. Fotos: Leandro Wirz





Vicky Cristina Barcelona

Foto: Divulgação


Assisti ontem à noite a Vicky Cristina Barcelona. Aviso: vou contar o filme. Se você ainda não assistiu, mas pretende, deixe para ler este texto quando voltar do cinema.

Já tinha visto o trailer e o argumento do filme me pareceu interessante. Além disso, é um filme com a assinatura do genial Woody Allen e tem no elenco Javier Barden, Penélope Cruz e Scarlett Johansson. Nem precisava tudo isso. Eu assistiria até peça de teatro infantil com a Scarlett. Até comprei o CD “Anywhere I lay my head”, em que canta com voz miúda canções do bardo Tom Waits.

O filme tem uma narração em off bastante freqüente, a história nos é contada como se alguém estivesse lendo um livro para ouvirmos. Recurso bem interessante e funcional, mas que tem o risco de parecer aquela leitura de cabeceira, que a gente usa para o sono chegar. Fica didático, mas esfria um pouco a história.

Vamos às apresentações: Javier é Juan Antonio, um pintor que teve um divórcio tumultuado de sua mulher, também artista plástica, Maria Elena (Penélope). Ou dois formarão um triângulo com a desocupada de plantão Cristina (Scarlett), no verão que ela passa em Barcelona com sua amiga Vicky (a excelente Rebecca Hall) e seu noivo/marido mauricinho Doug. Se contarmos que Juan Antonio também pega Vicky, então temos, na verdade, um quadrado amoroso.

Juan Antonio faz jus ao nome e merecia o título de Don. Seduz todas com charme e estilo, mas, no fundo é carente, incapaz de ficar só, que se une a mulheres instáveis para que ele não pareça tão fraco. Sua ex, atual e eterna, Maria Elena faz a linha sexy, criativa, brilhante, passional, temperamental, pirada. Uma mulher que faz lembrar a personagem maluca mala, otimamente interpretada por Leandra Leal em “Nome próprio”. Aliás, esta é uma característica comum entre os dois filmes. Tanto VCB quanto “Nome próprio” têm excelentes argumentos/roteiros que, no final, nos deixam a impressão de que poderiam ter virado filmes melhores do que são.

Scarlett Johansonn é a experimentadora, que busca não sabe o quê. Repete apenas que só sabe o que não quer. É uma insatisfeita crônica. Mas quem melhor a define é Doug, o marido de Vicky. Ele diz que ela é faz o tipo criativa-artista que ainda não se encontrou, julga-se pretensiosamente mais especial do que realmente é, porque, na verdade, esse tipo é apenas um clichê cansativo. Bingo! Conheço várias pessoas assim...

Cristina forma então um triângulo amoroso bem sucedido com Juan & Maria, em que todo mundo transa com todo mundo. Tudo vai indo bem, até que ela, claro, cansa. E resolve que quer outra novidade. Afinal, ela só sabe o que não quer... Daí, sem o elemento estabilizador, a relação de Juan & Maria entra de novo em sua espiral auto-destruidora. Na verdade, os dois estão presos um ao outro, dançando sua música doentia.

Vicky chega à Barcelona só para concluir o mestrado em Identidade Catalã, antes de casar-se com Doug, o certinho. Numa cena que ilustra bem o pragmatismo, o “what for?” dos nossos tempos, um amigo lhe indaga: “E o que vai fazer com isso?” (o mestrado). Vicky cai na sedução de (Don) Juan Antonio e é a única no filme que parece sentir dor verdadeiramente. Diante dessa situação inesperada ela se vê confrontada com seus sentimentos, seus planos e certezas. Ao final, depois de levar um tiro acidental de raspão da louca da Maria Elena, escolhe manter-se ao lado do marido, dizendo que não tem estrutura para levar aquele tipo de vida insana.

Talvez tenha sido isso o que mais me incomodou no filme. O maniqueísmo entre a paixão vibrante intensa louca versus o relacionamento estável, careta e chato. Isso é tão déjà vu. Todos os personagens são meio estereotipados nesse sentido. Fica aquela disputa tola entre a coragem da paixão contra a covardia do casamento ou da acomodação. Quando nenhuma das duas coisas é assim, na verdade.

Entre Vicky e Cristina, eu fico mesmo é com Barcelona. Cidade apaixonante, que parece um Rio de Janeiro que deu certo.

Eu esperava mais do filme. Mas, com todos os prós e contras, vale o ingresso, a pipoca e o refrigerante.

sábado, 15 de novembro de 2008

Desabafo

E já que estamos falando sobre dizer o que se pensa, ouçam sem parar a irresistível "Desabafo", faixa do novo álbum, "Arte do barulho", de Marcelo D2.

"Deixa, deixa, deixa eu dizer o que penso dessa vida, preciso demais desabafar..."

Este refrão é um sampler de um samba de 1973, de Ivan Lins, na voz da cantora Cláudia, sucesso daquela época.

Onde eu assino?


Tony Belotto, guitarrista, escritor, apresentador de TV e - last but not least - marido da Malu Mader, escreveu no último dia 10 de novembro, em seu blog Cenas Urbanas, o texto da seguir:

“Quem me conhece sabe que meus pontos de vista situam-se diametralmente opostos aos da religião e religiosos. Por exemplo: sou a favor da legalização do aborto, da união legal entre pessoas do mesmo sexo, das pesquisas com células-tronco, do uso de preservativos, da liberdade de escolha e da lei que criminaliza a homofobia. Sou contra o ensino de religião em escolas públicas, contra quem duvida da ciência em nome de um tal criacionismo e gostaria que notas de real não viessem estampadas com a frase deus seja louvado.

Em compensação, sou a favor da liberdade de expressão e de culto, respeito todas as religiões e crenças, e acho que todo mundo tem direito de acreditar e louvar quem ou o que quiser, assim como de não acreditar e não louvar igualmente. Simpatizo e concordo com os princípios filosóficos do budismo e do cristianismo e reconheço que a Bíblia é uma das obras literárias mais importantes da humanidade.

Sou a favor da liberdade, da democracia, da filosofia, da ciência, do diálogo, da dúvida e dos direitos individuais. Sou contra dogmas, fundamentalismos e certezas absolutas. Tenho a convicção de que religião não deve se misturar com política nem educação, sob o risco de se tornar doutrinação."

Assino embaixo.

Mais vergonha do que orgulho

Foto: De olho na bandeira do Brasil, Katia Franke, 2004.


Hoje, 15 de novembro, celebra-se a Proclamação da República do Brasil. Daqui a 4 dias, 19, comemora-se o Dia da Bandeira. Quando criança, semanalmente participava do ritual de hastear a bandeira e cantar o Hino Nacional no pátio da escola. Eram os tempos da ditadura. Eu, menino, não sabia nada disso. Com o tempo, esqueci parte da letra e hoje faço questão de não cantar o Hino Nacional em nenhuma ocasião. Embora o reconheça como um dos mais belos musicalmente, dentre todos seus similares.

Eu respeito a bandeira. A propósito, uma atitude muito educada e respeitosa que presenciei foi no show da banda americana Pearl Jam em dezembro de 2005, no Rio. Depois de se enrolar na bandeira brasileira jogada por um fã – clichê da diplomacia em apresentações – o vocalista Eddie Vedder, ao invés de simplesmente tirá-la de sobre os ombros e jogá-la em um canto do palco, fez questão de estendê-la e ir dobrando solenemente a bandeira em vários pontos até depositá-la cuidadosamente junto à bateria. Um show de civilidade e simbolismo.

Nascido no Rio, filho de mãe suíça e pai baiano, sou brasileiro, sim. Mas não sou patriota ou nacionalista ao extremo de pegar em armas para defender uma nação. Ou uma religião. “Imagine there’s no countries / it isn’t hard to do / nothing to kill or die for / and no religion too / imagine all the people living life in peace” (John - “vocês podem dizer que eu sou um sonhador, mas não sou o único” - Lennon)

Torço pelo Brasil na Copa, nas Olimpíadas, no Oscar. Até gosto de samba (Pagode, não).

Acho que a Amazônia é nossa.

Temos uma natureza generosíssima, exuberante. Um povo cordial, alegre, hospitaleiro, extremamente criativo. Lembro agora de um comercial das sandálias Havaianas, protagonizado pelo ator Lázaro Ramos, em que ele comenta com o cara que trabalha no quiosque da praia as mazelas do Brasil. Um argentino entra na conversa dizendo que é realmente uma pena, um país tão lindo etc etc. É imediatamente interrompido pelos brasileiros, que passam a defender o Brasil como uma terra sem problemas. O mais legal dessa campanha, ainda no ar, é que retrata uma característica muito própria da nossa passionalidade: só nós podemos falar mal do Brasil. Estrangeiro nenhum pode. Somos orgulhosos defensores de nosso País.

Eu não sou mais. Por volta dos meus 18 anos, segunda metade da década de 1980, aconteceu um episódio que hoje soa absurdo de tão anacrônico. Impedida pela Justiça de funcionar 24 horas por dia (vejam só!), a rede de postos de gasolina Itaipava distribuiu adesivos para os motoristas, nos quais aparecia parte da bandeira nacional e os dizeres: “País do futuro uma ova”. Eu aderi imediatamente. Já naquela época eu não acreditava nesse discurso ufanista prometendo um eldorado futuro. Como chegaremos à prosperidade se não pavimentamos o caminho com educação e saúde?

Desde a chegada dos europeus no século XVI, o Brasil foi uma terra explorada, pilhada, saqueada inescrupulosamente. A corrupção disseminada desde aqueles tempos entranhou-se nocivamente em nosso DNA cultural. Somos uma nação de individualistas em que prevalece a Lei de Gérson – levantar vantagem em tudo.

Hoje, o Brasil me envergonha mais do que orgulha. Trabalho de forma honesta e dedicada. Cumpro as leis, pago os impostos, procuro ser ético e respeitar os direitos dos outros cidadãos. Mas sou sistematicamente roubado, enganado, cerceado, achacado, desrespeitado.

Há controvérsias se a frase foi mesmo dita, na metade do século passado, pelo general Charles De Gaulle, então presidente da França. De qualquer modo, às vezes fica difícil discordar da sentença: "Le Brésil n’est pas un pays serieux" (O Brasil não é um país sério.)

O Brasil poderia ser tão melhor...

ps.: A trilha sonora para este texto não é o lindíssimo Hino Nacional. Mas sim a indignada canção “Que País é Esse?!”, da Legião Urbana. Especialmente, em suas versões ao vivo, quando o público responde à pergunta título: “É a porra do Brasil!”

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Eu tenho cara de otário

Já mencionei aqui no blog o perrengue que passei para comprar ingressos do show do U2 em São Paulo, em 2006. Foram catorze horas na fila graças aos (des)organizadores do evento. O horário de início das vendas atrasou, o sistema travou, informação não chegava, polícia ficou tocaiando, idosos alugados tendo prioridade para comprar os ingressos – obviamente, não encontrei nenhum velhinho saracoteando no show. A partir de um determinado momento, sair de lá com o ingresso virou questão de honra. Se já fiquei 6 horas, agora fico 8. Agora que já fiquei 13 horas, fico mais uma. Ao final do calvário, saí de lá com um voucher para ser trocado futuramente pelo ingresso. Valeu a pena, o show foi inesquecível.

Recentemente, fui ao show do REM. Os anúncios divulgavam o valor do ingresso inteiro de pista por R$ 200. Absurdamente caro, mas a gente junta os trocados, invade a área do cheque especial, parcela no cartão, mas não desperdiça a oportunidade de assistir a uma das bandas favoritas. A gente faz um tremendo esforço para se enganar e acreditar no tal do custo Brasil, país periférico,distante, fretes e bilhetes aéreos caros, cachês vultosos para fazer os artistas se deslocarem até os trópicos, pagos em dólar ou euros, a disseminação das carteiras de estudante falsificadas que impedem o empresário de cobrar um preço mais justo etc etc etc

Parênteses para o dilema de Tostines: se falsifica tanto CD e DVD porque eles são caros ou eles são caros porque o povo falsifica? . Tem tanta carteira de estudante falsa porque os ingressos para show, cinema, teatro são caros ou ....

Mas eu falava dos R$ 200 anunciados. Fui a um ponto de venda dos ingressos, Lojas Americanas, levando os R$ 200 em cash. Lá, o atendente fez meu cadastro e comprou o meu ingresso pelo site. Ora, isso eu poderia ter feito de qualquer lugar, não precisava ter ido ao ponto de venda. Aliás, no ponto de venda, o único meio de pagamento disponível era cartão de crédito. E me cobraram a taxa de conveniência de R$ 30. E me entregaram um voucher para eu trocar na bilheteria do local antes do show e pagar outra taxa de R$ 5. Conveniência de quê? Para quem? Além disso, se a inconveniente taxa é obrigatória, então, o preço do ingresso não é R$ 200, como anunciado. É R$ 230.

Também já postei há tempos a via crucis para comprar ingresso para o show da Madonna que acontecerá em dezembro. Depois do caos inicial (vide textos de 6 e 13.set.2008) , anunciaram show extra. Mais adiante, os organizadores inovaram. Introduziram o conceito de “redisponibilização” de ingressos. Ou seja, depois de afirmar que os tíquetes para o show do dia 14 de dezembro estavam esgotados, eles ressuscitaram. Nesta semana, mais uma pérola. Quem comprou o ingresso pelo telefone, não vai mais recebê-lo em casa, como prometido. Agora será preciso retirá-lo em um local determinado e ainda pagar R$ 8 de taxa de impressão! Oito reais, porque a tinta de impressão é o líquido mais caro do mundo (sério, mais do que petróleo) e o preço do papel está pela hora da morte.

Eu agora também vou cobrar taxa de conveniência. Cansei de ser otário de graça.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

O mais querido

charge de Aroeira, publicada hoje no jornal O Dia (RJ)


domingo, 9 de novembro de 2008

And I feel fine


Ontem à noite, preenchi uma lacuna em minha felizmente longa ficha corrida de shows. Fui assistir ao R.E.M. no longínquo, mas ótimo, espaço do HSBC Arena. Michael Stipe é uma das minhas vozes favoritas no mundo do rock e gosto muito dessa banda de Athens, Geórgia, na estrada há 28 anos.

22h35: no telão atrás do palco aparece digitado “Boa noite, galera do Rio”. E Stipe (voz), Mike Mills (baixo, teclados e vocais) e Peter Buck (guitarra) entram fazendo jus ao nome do último disco, que batiza a turnê: “Accelerate”. A primeira faixa para levantar o público é “Living well is the best revenge”.

Na terceira música, “What’s the frequency Kenneth?”, o careca Stipe, elegante de jeans, camisa social, gravata e blazer, começa a dar pinta e seu rebolado faria Ney Matogrosso ficar com inveja.

No show, alternam-se músicas dos muitos álbuns da banda, com ênfase no repertório de “Accelarate”, e diversos hits, ao gosto do público brasileiro: “Orange crush”, “Everybody hurts” (com coro da platéia), “Drive”, “The one I love”, Nightswimming”, esta em momento intimista com direito a selinho entre Stipe e Mills ao final.

O cenário era básico, apenas três telões ao fundo, sem pirotecnias, sem trocas de figurino. Show simples, direto ao ponto. Rock honesto, de primeira, feito por caras que dominam e gostam do que fazem.

No âmbito da diplomacia, claro, não faltou Stipe se enrolar na bandeira brasileira jogada ao palco por um fã. Isso é de lei em shows internacionais por aqui. Previsível também a publicidade que fez da Anistia Internacional, comum a artistas engajados. O inusitado da noite ficou por conta da propaganda que Stipe espontaneamente fez. Ele pegou uma lata de cerveja que estava próxima à bateria e disse, em inglês: “Não sei como pronunciar isso...Itapava? É muito boa”, afirmou, engolindo o “i” e dando mais um gole. Nem só de Budweiser vivem os americanos.

Stipe também disse que eles estavam “so fucking happy” com a eleição de Barack Obama, e surgiram imagens dele nos telões, devidamente aplaudidas.

O bis foi extenso, com cinco canções, dentre elas o carro-chefe do último disco, “Supernatural superserious”, a indefectível “Loosing my religion” e “Man on the moon”, que fechou a noite às 00h30.

Em suma, 1h55 de um showzaço! Já no bis, depois de apresentar a banda (o trio, apoiado por mais um guitarrista e um batera), Stipe sentenciou: “Nós somos o R.E.M. e isso é o que fazemos.” E fazem muito bem.

“It’s the end of the world as we know it and I feel fine”.

So fucking fine! Valeu, R.E.M.!

Ps.: eu vi uma mulher se ajoelhar e agradecer aos céus ao final do show. Eu já fiz isso uma única vez. Foi quando descobri que Deus existe e toca nos Stones. Foi na turnê de Voodoo Lounge, a primeira vez que assisti a Jagger, Richards, Wood & Watts.

sábado, 8 de novembro de 2008

Obama é bom

O cachorro mais lindo do mundo. Foto: Leandro Wirz



Obama começou bem. Nesses primeiros dias pós-eleição fez felizes declarações, a começar pelo antológico discurso da vitória, que fez muita gente chorar. Em seguida, falou sobre as dificuldades e o trabalho duro que precisará ser feito para tirar os EUA da crise. A taxa de desemprego é a maior em 14 anos. Big pineapple!

Foi hábil também em resistir às pressões iniciais para anúncio de equipe e deixando claro que não montará um governo paralelo nesses meses de transição, tirando o que resta de autoridade ao presidente no ocaso do governo Bush. "Os EUA tem apenas um presidente e um governo." Ou seja, cada um a seu tempo. Foi diplomático, sem ser omisso. Cobrou medidas ainda no final desse governo e que se não forem feitas já, ele as fará assim que tomar posse.

Mas o golpe de mestre veio no dia em que o cachorrinho scottish terrier Barney, da família Bush, mordeu o dedo de um jornalista da Reuters. Nos EUA, é tradição a família do presidente ter cachorro. Apenas 5 dos 43 presidentes não tiveram.

Perguntado sobre que cachorro levará para a Casa Branca, Obama respondeu que levará um cão abandonado num abrigo. "Quero um vira-lata, como eu". Bingo!

Obama é mesmo bom de marketing. Esse cara vai longe.

E eu, se um dia for à Casa Branca, vou levar o meu golden retriever. Obviamente, o cachorro mais lindo do mundo. Alguém duvida?

Claramente sem noção

Coisa mais sem noção, desmedida, ridícula mesmo. A empresa de telefonia Claro, patrocinadora do Rio Summer Fashion, publicou hoje anúncio de página inteira no jornal O Globo, caderno Cidade, dizendo: "Obrigada, Valentino. A cidade do Rio de Janeiro agradece a sua presença."

O saudoso Bussunda diria "Fala sério!". O Rei Juan Carlos diria "Por que não te calas?".

Valentino é um dos maiores estilistas do mundo, ok? E daí? Em sua passagem pela cidade foi apenas uma figura metida à besta que, segundo noticiou Joaquim Ferreira dos Santos em sua coluna, não permitia que gente desconhecida entrasse no elevador junto com ele. Talvez para que ninguém pisasse em seus horrorosos sapatos bicolores.

Na primeira fila dos desfiles, pediu aos seguranças que formassem uma parede instranponível aos jornalistas. "E ele, lá, com cara de paisagem, insuportavelmente pedante, cabelo laranja cheio de laquê, e balançando pulso, com um relógio branco com brilhante incrustado."

Ou seja, totalmente sem noção. Como a Claro. Não tinham destino mais inteligente e menos deslumbrado para a verba publicitária?

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

OBAMA BAMBAMBAM


Nesta semana rufaram os tambores do Quênia ao Delta do Mississipi. Aliás, acho que por toda a América, exceto em rincões rurais do Kentucky e do Texas, e noutros, gelados, do Alaska. Em boa parte do mundo se fez festa.

Há mesmo motivos para se comemorar. É muito significativo - congratulações aos eleitores americanos – que um político negro, jovem, nascido no Havaí, com raízes muçulmanas tenha chegado à Presidência da maior potência mundial. Do ponto de vista de marketing político, sua estratégia de campanha foi brilhante. É uma enorme vitória contra o preconceito em um país que luta para se livrar de ranços racistas.

A festa é a da mudança e a da esperança. Bem vindas. Tenho a impressão de que se Hillary fosse a candidata democrata também sairia vitoriosa. E os jornais mundo afora estariam estampando manchetes, não sobre a revolução histórica de um afro-descendente no poder, mas sobre a novidade histórica de uma mulher na Casa Branca.

Os eleitores queriam mesmo o fim da era Bush. E McCain era Bush again. (perdão pela rima).

Seja como for, Obama tem uma missão extremamente árdua, que é tirar os EUA da crise em que se encontra. Deram-lhe a missão impossível de salvar o mundo. Depositam nele exageradas expectativas e isso não é saudável.

Obama é humano e não o messias. Vai acertar. E errar. Vai ser aclamado. E vai decepcionar também. Melhor para todos seria se as expectativas fossem trazidas a um patamar mais realista.
E melhor ainda será o dia em que a cor da pele de um presidente e de um cidadão, nos EUA, no Brasil ou em qualquer lugar, for uma irrelevância.


Good luck, Mr.Obama.

Partidarismo vs. isenção

Há umas postagens atrás, mais precisamente em "O pêndulo", de 01.11.2008, escrevi sobre a mídia deliberadamente tomar partido do candidato A ou B.

Transcrevo a seguir trecho publicado no podcast do colunista Diogo Mainardi, da revista Veja, em 06.11.2008.

"A imprensa americana errou na guerra do Iraque, publicando os relatórios passados pela Casa Branca e pelo Pentágono sem checá-los, sem apurá-los, sem investigá-los. Com Barack Obama, ela repetiu o mesmo erro. A imprensa pode apoiar um candidato, como apoiou Barack Obama, mas sem permitir que esse apoio interfira na cobertura dos fatos. O partidarismo dos jornais e das TVs contra os republicanos me incomodou tanto que, a certa altura, eu já estava defendendo apaixonadamente o Criacionismo". (Diogo Mainardi)

Com quem será?

Se deu empate no telecatch entre Fantomas versus O Justiceiro, no Maximídia (vide postagem de 01.11.2008), agora a peleja desempatou. E tocou na parte mais sensível do corpo: o bolso.

Muita gente sabe - mas é bom equalizar a informação - que a agência África, de Nizan Guanaes, atende ao Itaú e que a F/Nazca, de Fábio Fernandes, detém a conta do Unibanco.

A África abriu o placar, porque faturou o comunicado impresso nos jornais desta semana, bem como o primeiro filme para TV que foi ao ar ontem divulgando a fusão Itaú-Unibanco. O comercial de 60 segundos tem como slogan: "Um banco global, orgulho nacional".

Como será dividido esse bolo, ainda não se sabe, e é assunto que só deve ser decidido mais à frente quando terminarem todos os procedimentos burocráticos e jurídicos para a fusão entre os dois bancos.

Mas pode ser que haja perda para quem curte boa propaganda. Afinal, sempre tínhamos materiais de duas empresas no ar e com linhas criativas bastante distintas. Agora, será só uma, seja ela qual for. Sem polemizar entre Nizan e Fábio , eu sempre achei o Itaú o benchmarking da propaganda de bancos brasileira.

Mudando de assunto, mas nem tanto, um amigo comentou que achou um espanto o comercial veiculado na rádio CBN do Nizan. Ele, em off, dizia algo parecido com: "Eu, Nizan Guanaes, realizador do Rio Summer Fashion, quero agradecer o apoio dos patrocinadores e blá, blá blá..."

"Eu, o realizador" E a equipe? Fez tudo sozinho?! E mais: desse jeito parece que ele vir a público agradecer aos patrocinadores é uma deferência. Afinal, é ele que está agradecendo. Não é qualquer um.

Mas, pensando bem, por que o espanto?! Somos publicitários. E assim é Nizan.

Às vezes o Nizan, sem dúvida talentoso e empreendedor, parece argentino. O argentino que está transando com uma mulher e quando ela geme de prazer e diz: "Meu Deus!", ele responde: "Querida, na intimidade pode me chamar de Juan".

Quem se lembra do caso Eloá?

Sem querer requentar matérias frias, mas acho que ainda vale replicar aqui texto do Ombudsman da Folha de S.Paulo criticando a cobertura sobre o caso Eloá.

Esta postagem complementa a que publiquei em 23/10/2008, com o título de "Com respeito a dor dos outros".



"Quem se lembra do caso Isabella?
Copyright Folha de S.Paulo - São Paulo, domingo, 26 de outubro de 2008

A COBERTURA do caso Eloá em Santo André pela Folha foi acanhada, acrítica e burocrática.
O jornal tem todo o direito de decidir apenas registrar casos policiais como este. Pelo meu gosto, é exatamente o que deveria fazer.
Mas, se resolve que um crime é importante, ou investe e faz a coisa direito ou sofre pelo trabalho malfeito.
Por dez dias, o episódio constou da primeira página, sete com foto. É claro que era prioritário para a Redação.
Mas até sábado, o espaço para o noticiário foi pequeno e, mesmo depois, o esforço foi inconstante: alguns dos melhores repórteres entraram e saíram; a maior parte das retrancas era de declarações públicas e fatos já noticiados pela mídia eletrônica.
Faltou espírito crítico. Registraram-se opiniões contrárias à volta da amiga da namorada ao cativeiro desde o primeiro dia, mas de modo geral em tom ameno. Faltou "vontade editorial".
As versões da polícia ganharam sempre mais destaque, a ponto de na terça-feira o perfil de um dos negociadores o retratar quase como herói. É justo mostrar o lado dos policiais e realçar seus aspectos positivos. Mas elegias numa operação que claramente fracassou são inadequadas.O jornal foi burocrático ao acompanhar a tragédia. Limitou-se quase sempre a dar informação bruta, que o leitor provavelmente já havia recebido pelo rádio ou TV. Houve pouca análise, interpretação, informação exclusiva.
Meu antecessor Mário Vitor Santos em artigo para a revista "MSG" lembra que "o bom teatro lida com os instintos mais básicos da platéia, mas também suscita reflexões sobre a natureza profunda do ser".

Não se pode exigir que jornalistas sejam Shakespeares. Mas eles bem podem jogar luzes sobre desgraças como esta, oferecer visões psicanalíticas, sociológicas, promover o debate sobre políticas e instituições públicas envolvidas (da polícia aos conselhos tutelares, do governo à mídia).
Se o jornal resolve que o crime é importante, ou investe, com espírito crítico, e faz a coisa direito ou sofre as conseqüências do trabalho malfeito
Da mídia, por exemplo, este jornal só começou a tratar na terça-feira. E modestamente. Muitos leitores escreveram para se queixar dela.De fato, os meios de comunicação ajudaram muito para criar esses infortúnios: ao tornarem o assassino uma celebridade, interferirem na ação das autoridades, transformarem o drama em circo e incentivarem a curiosidade mórbida do público, que impediu a família até de se despedir em paz da vítima.
Mas isso não é exclusividade nem do Brasil nem destes tempos. Talvez seja inevitável. Ocorre em todos os países. Veja-se o caso do pai que aprisionou a filha na Áustria.
E em todos os tempos. A revista "O Cruzeiro" tratou o caso Aída Curi, há 50 anos, com tons de sensacionalismo que fazem o jornalismo atual parecer sóbrio.
Mesmo sem mídia, o prazer doentio de ver detalhes de tragédias emerge a toda hora. Quem já não testemunhou dezenas de motoristas reduzirem a velocidade para olhar o motoqueiro caído na rua?

O ser humano é assim. O que não impede que se tente melhorar."

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Pequena crônica sobre amizade e amor

Eu tenho um amigo, também escritor, 21 anos (uma maioridade!) mais velho do que eu. Eu o chamo, afetuosamente, de Bwana. Nesses 13 anos de amizade, ele me ensinou tanto quanto um pai. Com ele, aprendi sobre a vida, sobre a aventura de ser humano, sobre relacionamentos, sobre literatura.

Um fato ilustra bem a figura. Certa vez, fomos ao Maracanã assistir a um jogo do Flamengo e, para forrar o pedaço da arquibancada em que ele iria sentar-se, sacou uma edição do Le Monde Diplomatique.

Almoçamos juntos nessa semana e, como de hábito, bebemos vinho e falamos sobre mulheres, livros, planos, política (aqui sempre discordamos: ele cisma que eu sou de direita), viagens, trabalho, dinheiro, futebol, “sei lá, mil coisas”. Então ele me perguntou se estou escrevendo poesia.

Respondi que quase nada. Pedi licença para me valer de um clichê, mas a verdade é que ando feliz demais para escrever.

Ele me disse que é, sim, um clichê. Mas dispensou minhas desculpas. Uma verdade não chega à toa a clichê, afirmou.

Eu estou serenamente feliz. Eu (quase) não escrevo mais poesia. A culpa é da minha mulher.

E eu lhe sou eternamente grato.

sábado, 1 de novembro de 2008

Pai, eles não sabem o que fazem...

A revista Veja que circulou nesta semana publicou conversa do senador americano Ernie Chambers com a jornalista Mariana Amaro. Leia a seguir:

“Acuso Deus de todos os desastres

Os políticos brasileiros não são os únicos que gostam de fazer bizarrices. Ernie Chambers, senador americano de Nebraska, resolveu abrir um processo contra Deus. Perdeu, mas já avisou que vai recorrer.

- De que o senhor acusa Deus?
- De todos os desastres: furacões, tornados, doenças, fome.

- Por que o senhor resolveu processa-lo?
- Havia uma articulação no meu estado para tornar algumas pessoas inimputáveis, e eu quis provar que qualquer pessoa por ser processada.

- Mas Deus é uma pessoa, por acaso?
- Não necessariamente, mas a sua existência está provada, pelo menos nos Estados Unidos.

- Como assim?
- No dólar, o que está escrito? “Em Deus nós confiamos”. No tribunal, jura-se por Deus. Para os EUA, a existência de Deus é incontestável.

- Como se faz para intimar Deus?
- Ele não é onisciente? Então, sabe que está sendo processado. Não é onipresente? Então, estará na corte no dia do julgamento.

- Mas o processo foi arquivado.
- Sim, mas eu vou recorrer.

- Então, o senhor acredita em Deus.
- Na verdade, não. Quem precisa acreditar é a Justiça. Não acredito e, por isso, não tenho medo de ir para o inferno.”


Fiquei pensando, acho que também vou processar Deus por eu não ter nascido sultão do Brunei ou por não ter herdado os olhos azuis do meu avô. Ou será que a culpa é a da minha mãe?

Decidi que o melhor é por o CD do Morrissey para tocar repetidamente “I have forgiven Jesus”.

Aliás, Morrissey é um deus.

Só na rua


Teve gente que ficou bege ao ver a capa deste jornal marrom. Os tablóides sensacionalistas ingleses se rasgaram de inveja. O Meia Hora numa das edições desta semana cunhou esta formidável manchete: “Luana não tem mais Dado em casa.”

Usou a foto do ator/cantor/ciumento Dado Dolabella, ex-namorado/noivo/rolo da linda/maravilhosa/desbocada Luana Piovani para compor o título, nos moldes daquelas cartas enigmáticas de revistinhas de passatempo.

E fez na primeira página essa piada de duplo sentido e péssimo gosto. Que caiu no gosto da camada da população que compra esse jornal.

Bem, sempre se pode dizer que é melhor ler isso do que não ler nada.

No mais, vamos combinar que essa novelinha mexicana do casal na imprensa já deu. Ou melhor, nunca deveria ter...dado.

O pêndulo




No dia seguinte à vitória da Eduardo Paes, o jornal O Globo publicou em sua primeira página uma lista com 39 promessas do candidato que a população deve cobrar. A lista veio demarcada por uma linda pontilhada, para ser recortada e mantida na agenda, na porta da geladeira, ou em algum lugar visível.

Independente do jornal e do candidato, a iniciativa é ótima e deveria virar rotina. Nós nunca cobramos de quem elegemos. Mea culpa: eu sequer lembro em quem votei para vereador neste ano. Nem mesmo para deputado estadual nas eleições anteriores.

No outro dia, o mesmo jornal anunciava em manchete que o prefeito eleito já descumprira três das promessas da lista. Ou seja, o sinal foi claro: o jornal não pretende dar tréguas. Será de oposição.

E aí chegamos ao ponto: a propalada imparcialidade da imprensa. Para mim é um mito. Uma falácia.

Quando um jornal qualquer, por exemplo, anuncia-se como imparcial, como aquele que narra os fatos, sem distorcê-los, oferecendo a verdade aos seus leitores, isto é muito mais do que uma informação. O jornal pretende convencer os seus leitores – e potenciais leitores – disso. Assim, eles poderão sentir-se inclinados a comprar o jornal. Todo discurso é persuasivo. Pretendemos sempre convencer o interlocutor da nossa verdade e para isso oferecemos-lhe algo verossímil.

Portanto, não há discurso que seja isento de subjetividade, não há neutralidade. Não há a verdade na imprensa. Existem as verdades. Realidade é relativa.

A impressão que eu tenho é a de que antes havia uma tentativa dos veículos de comunicação em disfarçar suas opções políticas. Havia mais cuidado em não deixar transparecer. Hoje, parece que estão mais despudorados.

Obviamente, não estou falando aqui dos jornais e emissoras de rádio pertencentes a políticos. Nesses casos, tudo sempre foi às claras. Era o jornal do Collor em Alagoas, o jornal do ACM na Bahia e por aí vai.

Sem nenhum esforço, me vem à mente a revista Veja fazendo oposição ao governo Lula e a Carta Capital posicionando-se a favor. Os jornalistas mais prestigiados também não escondem suas opções. Diogo Mainardi, Reinaldo Azevedo, Elio Gaspari de um lado. Jorge Bastos Moreno, do outro, ao lado do PT. Colunistas também escancaram suas preferências nas últimas eleições municipais: Martha Medeiros e Arnaldo Jabor, por exemplo, apoiaram Gabeira.

Como fica a credibilidade de um veículo quando assume a sua posição? Como confiar no conteúdo de informação que ele traz? Será que a credibilidade realmente fica abalada? Ou assumir é melhor do que a imparcialidade velada? É melhor escrachar do que ser hipócrita? Penso que é melhor assumir, ninguém mais é tão ingênuo hoje em dia a ponto de acreditar na neutralidade.

Então se os veículos assumem suas posições políticas, assumem de que lado estão, em que medida eles deixam de ser imprensa para ser material publicitário?

Nos EUA, os grandes jornais fazem editoriais assumindo suas posições. Compra quem quer. Cada um sabe o que vai encontrar lá. Li uma notícia recentemente que dizia que cerca de 70% (não me recordo bem do número, é algo próximo a isso) dos jornais americanos haviam se manifestado pró-Obama. Ou seja, é campanha aberta.

E há, ainda, o grupo de veículos que são como pêndulo. Mudam de lado conforme o quinhão de verbas publicitárias que recebem. Nutrem fidelidade sincera pelo dinheiro.
E você, de que lado está? Eu estou do lado do bem.

A vitória de Gabeira

foto: Leandro Wirz






Todo mundo já sabe, Gabeira não foi eleito prefeito do Rio. Mas mesmo perdendo, Gabeira saiu vencedor. Gabeira ganhou reconhecimento, admiração, respeito, visibilidade, importância.

Reproduzo trecho de texto que a jornalista Cora Ronai escreveu, publicado no blog http://marcelotas.blog.uol.com.br/ : ” Em compensação, como carioca, perdeu a chance de viver um momento histórico, em que a prefeitura seria, afinal, ocupada por um homem de bem, com idéias novas e um novo jeito de fazer política; perdeu a chance de ver o Rio de Janeiro sair do limbo a que foi condenado nas últimas décadas, e ganhar projeção pela singularidade da sua administração.Se Gabeira tivesse sido eleito prefeito, o Rio, que hoje não significa nada em termos políticos, voltaria a ter relevância, até pelo inusitado da coisa. Um prefeito eleito na base do voluntariado, do entusiasmo dos eleitores e da vontade coletiva de virar a mesa seria alguém em quem o país seria obrigado a prestar atenção.”

Votei com tesão e fé em Gabeira.


Sobre as eleições cariocas, o jornalista Ricardo Noblat escreveu em seu blog:
“Gabeira acreditou que a comunicação direta com o eleitor poderia levá-lo à vitória. Quase levou. Mas ao fim e ao cabo ganhou a política real. E o que é isso? Em resumo é a política de alianças, do loteamento futuro da máquina administrativa, dos gastos milionários, da propaganda massiva e das manobras sujas, às favas todos os escrúpulos.

- Você está disposto a pagar qualquer preço para vencer, eu não - disse Gabeira a Paes durante debate promovido pela Rede Bandeirantes de Televisão.

Acertou quanto a Paes. Acertou quanto a ele mesmo".

Merval Pereira escreveu que Paes terá que governar ciente de que metade da população carioca se manifestou dizendo que quer um outro jeito de fazer política.


Eu sempre fui contra a obrigatoriedade do voto. Voto é direito, não obrigação. E concordo com Herbert Vianna quando compôs a letra da canção dos anos 1990 – e ainda atual – “Luís Inácio (300 picaretas): ”Eu me vali deste discurso panfletário, mas a minha burrice faz aniversário ao permitir que num país como o Brasil ainda se obrigue a votar por qualquer trocado, por um par de sapatos, por um saco de farinha, a nossa imensa massa de iletrados”. A propósito, o escritor João Ubaldo Ribeiro publicou, em 5/10, interessante artigo no O Globo criticando a obrigatoriedade do voto, intitulado “Vamos cumprir essa formalidade”.

Dito isso, devo confessar que senti uma dor no peito quando vi o número de abstenções. Apesar de o voto ser obrigatório, no Rio as abstenções chegaram perto de um milhão. Só na Zona Sul, reduto eleitoral onde Gabeira deu uma banho de votos em Paes, foram 158 mil ausências. E no cidade toda, Paes ganhou por uma margem de apenas 55 mil votos. Ou seja, o resultado da eleição mais disputada que o Rio já viu poderia ter sido diferente. Mas a vida não é feita de “E se...”. Não foi. E ponto. Vamos lá, Gabeira Senador em 2010.

Já tivemos coisa muito, mas muito pior por aqui do que o Eduardo Paes. Acho que o problema maior de Paes está no “a qualquer preço”. Ou seja, nas alianças espúrias que fez, essas sim, com uma corja de políticos para os quais a gente precisa tapar o nariz quando se aproximam. Paes também é um sujeito ambicioso, que muda de partido (e de idéia) como sua mulher (que afirmou, em entrevista, não ler jornais) troca de vestidos. E hoje bajula quem outrora criticou. Aliás, esta é uma velha e asquerosa prática da política, essa coisa muito suja, como disse Dona Marta Suplicy.


Paes irá governar uma Cidade Partida (leiam o livro homônimo de Zuenir Ventura). Vou torcer para que, apesar de tudo, ele faça uma boa administração, porque o Rio precisa e muito. Mas estou certo de com Gabeira seria beeemmm melhor.

Arthur Dapieve sintetizou : "O Rio deu bobeira". A rima é fácil de completar.

Fantomas vs.O Justiceiro

Fantomas versus O Justiceiro



Os ditadores, os artistas e nós, publicitários, somos, via de regra, sujeitos de ego inflado. Não é novidade.

Mas foi interessante – e hilário - assistir ao duelo de dois titãs da propaganda brasileira, travado no Maximidia, São Paulo, no início de outubro, por Nizan Guanaes e Fábio Fernandes. Muito mais empolgante do que qualquer debate eleitoral entre os candidatos municipais e até mesmo do que os embates entre Obama e McCain.

O vídeo esteve disponível no You Tube. Era só buscar por Nizan, e/ou Fábio e/ou Maximidia que vc encontraria. Eram exatos 8’57’’ para assistir essas mundanices do mundinho. Mas, as forças ocultas o retiraram do ar. Era briga boa, telecatch (quem lembra do Fantomas?) de primeira.

Bem, a polêmica ainda está por aí. Fique livre para ir à cabine eleitoral, e votar eletronicamente aqui neste blog, no seu favorito.

O trecho a seguir é reprodução de e-mail que recebi:

“Carta mostra críticas de Fábio Fernandes a Nizan Guanaes
20/10/08
A discussão entre Fábio Fernandes e Nizan Guanaes pelo jeito não se restringiu ao evento MaxiMídia.
A peça divulgada posteriormente em jornais pela F/Nazca, agência comandada por Fábio, não pareceu ser suficiente para encerrar o assunto.Nos últimos dias tem circulado no mercado publicitário uma carta em que Fábio aparece como autor. Nela, o publicitário eleva o tom e critica duramente Nizan Guanaes, dono do grupo ABC. Os adjetivos vão desde "vil e pernicioso" à indústria da publicidade a "oportunista, aproveitador, manipulador".O comunicado foi emitido internamente para os funcionários da F/Nazca. Entretanto, acabou vazando para outras vertentes do setor publicitário.
O Adnews entrou em contato com a assessoria de imprensa da agência, que não quis confirmar se o texto foi efetivamente escrito por Fábio Fernandes.
http://www.adnews.com.br/negocios.php?id=78268
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Por Fabio Fernandes (F/Nazca)
Achei que devia escrever a vocês para falar sobre o Maximidia e o debate/embate que eu travei com o Nizan.
Acho que não é novidade para os mais próximos e os nem tão próximos que tenho diferenças profundas, quase religiosas, na visão sobre o que é e o que deve ser o negócio, o objetivo do trabalho, a missão, os processos, a forma e o conteúdo do produto finalidade uma agencia de propaganda, em relação ao dito personagem - pra mim, uma caricatura de ser-humano, dublê de político populista e novo-rico deslumbrado, comediante de frases de efeito repetidas à exaustão, arremedo de empresário anti-ético e criativo anti-estético.
Nunca escondi - nem dele - que o acho vil, pernicioso à nossa indústria, predador, oportunista, aproveitador, manipulador. Nunca deixei de observar e comentar que todo o tempo em que ele esteve criador, foi um tempo que ele utilizou apenas para forjar um personagem que, com tino e capacidade de observação, o levaria a ter seu próprio negócio, onde ele reproduziria não aquilo que ele almejou como empregado mas, ao contrário, os piores modelos, os piores ambientes internos, piores lugares comuns, entre todas as agencias em que ele trabalhou. Desde que isso, convenientemente, implicasse em fazê-lo mais forte, mais rico, mais poderoso.
Nizan é um caso típico de uma pessoa que quanto mais tem mais quer. E que quanto mais quer menos mede esforços e as conseqüências nefastas dos atos que ele pratica para ter mais. Ele é o exemplo pronto e acabado da insustentabilidade. Se fosse presidente dos EUA não seria em nada diferente de Bush - só o discurso seria mais engraçado. Mas invadiria o Iraque, deportaria estrangeiros, perseguiria minorias, poluiria a atmosfera, cagaria para o mundo. O que interessa para ele é ele. E por ele, acha ele, que pode, ele, tudo. Mas a minha questão mais vital em relação a ele, é o fato de que - queira eu ou não - ele se transformou em uma celebridade da propaganda brasileira. Os incautos, os bobos da corte, os novatos, os leigos, os incultos, clientes inclusive, publicitários inclusive, imprensa, principalmente, inclusive, o acham o máximo. E eu, que convivo muito bem com as minhas invejas, meus desencantos, meus fracassos, não teria nada a objetar se ele o fosse de fato.
Portanto não é este, em nenhuma hipótese, o meu problema com ele. O meu imenso, colossal, infinito problema com ele é que, amparado por essa "populariadade", "unanimidade", "superioridade" ele diz o que quer, do jeito e na hora que quer, destruindo o que quer, com voz e pompas de "representante da categoria". Agencias que produzem trash for cash (ou, lixo por dinheiro, em bom português) existiram e existirão sempre. Na realidade, em boa parte elas até nos ajudam a sermos melhor percebidos como inovadores, originais, cuidadosos, diferentes. O Brasil, entretanto, é o único país do mundo onde a publicidade tem no discurso do seu maior expoente que "o que é bom é feito para ser copiado", "propaganda criativa é bobagem", "eficiência é o contrário de originalidade", ou as pérolas que ouvimos no próprio Maximídia "momento de crise não momento de inovar". Ou seja: na falta de capacidade ou de vontade de fazer boa propaganda,
Propaganda de qualidade (o que, obviamente, na nossa opinião passa obrigatoriamente por inovação, criatividade, excelência na execução e excitação do pessoal interno de uma agencia de propaganda) o que ele faz - oficialmente - é nos colocar na posição de meninos traquinas, revoltadinhos de plantão, criativos irresponsáveis que querem brincar com o dinheiro dos clientes, enquanto ele finge que é Jack Welch, Warren Buffet ou Armínio Fraga. Nizan não sabe mais quem ele é. Ele é publicitário mas quer fingir que é analista econômico. Foi criativo mas gostaria mesmo era de ser dono da Ambev. Tem um business microscópico mas arrota ares de colega de turma de um Jorge Gerdau.
Mas eu sei quem é Nizan. É um demagogo. Ele sabe bem que o discurso do tradicionalismo, do conservadorismo, da mediocridade, dapasteurização, agrada em cheio a uma imensa gama de bundões de plantão que preferem demitir do que investir. Preferem temer do que empreender, preferem dividir os prejuízos, já que nos lucros ele posa com a esposa em sandálias de 3.200 reais em seu apartamento em Paris. Preferem disseminar o caos, porque a alegria dos bons momentos ele rega com champagne em festas particulares com celebridades estéreis e etéreas de ultima hora.
Na publicidade, que afinal é o meu negócio, embora sempre que eu fale nisso ele ache que o assunto está infantil demais (lembrem-se, ele é um business man) ele sabe também que há bundões prontos a gastar mais para contratar uma meia dúzia de artistas famosos, cantando um jingle com uma logomarca formada por funcionários da empresa, do que se "arriscarem" a criar um posicionamento de verdade, uma linguagem proprietária, um estilo único e próprio. Na visão desse chupa-sangue de plantão, ele está certo. Tanto que acerta duas vezes com uma mesma tacada: acalenta os desejos mais primitivos de um ou outro cliente cagão e ainda fatura muito mais em cima do trouxa que tem que enfiar todo o dinheiro do mundo para serouvido/visto/lembrado com uma bobajada cheia de clichês e formulinhas baratas, que definitivamente não sobreviveriam a um plano de mídia comprado com poucos recursos. De quebra, ele ainda usa todo o seu arsenal de repetidores e baba-ovos da imprensa e arredores para confirmar que um monte de estrume na verdade é um pote de ouro. E o bobo alegre que aprovou e pagou pela campanha, acha que fez a coisa certa de novo. Reis nus. Que se sentem vestidos com o melhor da tecnologia e design da indústria têxtil. E eu, daqui do alto da minha inocência, só vejo que eles têm pênis pequenos.
Não é à toa que ele está tão preocupado com a crise de liquidez que todos vamos enfrentar nos próximos tempos. Ele sabe que o dinheiro, quanto mais valioso e raro fica, melhor tem que ser aplicado. E, com menos dinheiro, é a inteligência o que a propaganda vai voltar a exigir. Quanto mais economizarmos, compensados por uma mensagem forte e memorável, mais eficientes seremos para os nossos clientes. Ninguém lembra de um amigo medíocre que fala pouco, alguns até se recordam de um amigo chato que fala muito, mas todos sentem saudades do amigo genial que falava coisas legais. Ou seja: o modelo de negócio dele desmoronou. A festa acabou para quem não passava de vendedor de um montão de espaço na mídia e começou para quem tem o Que e o Como dizer nesse espaço, que será inevitavelmente menor. E isso ele não sabe fazer. Isso foi o que suscitou o nosso duelo na última quinta feira.
Ao contrário do que ele ainda tentou fazer alguns crerem, eu não estava discutindo sobre o ofício da criação ou sobre "leões em Cannes". Ao contrário do que ele fingiu que estava acontecendo, a nossa discussão não era sobre a criatividadezinha e os sonhos dos seus pequenos criadores. Nós discutíamos sim era sobre uma questão que, apesar de tudo, ele mesmo ainda tem senso crítico suficiente para entender, mesmo que intimamente isso seja altamente doloroso, já que foi o que um dia ele mesmo já tanto defendera. Nós estávamos discutindo caráter. Porque, ao contrário dos que não oferecem o melhor para os seus clientes por falta de recursos, talento, ferramental, essa mediocrização a que ele está submetendo as agencias controladas por ele é um esforço premeditado para esvaziar toda e qualquer possibilidade de que o discurso dos que fazem melhor, com mais interesse, mais cuidado, mais compromisso e mais responsabilidade se reestabeleça. O trabalho que as agencias do Nizan faz, a maneira como ele trata seus funcionários, as propostas comerciais indecorosas que elas oferecem aos seus clientes, não seriam um problema tão grande se não fosse o fato, como eu já disse, de que o discurso que o embasa é avassaladoramente mais potente que o que nós e outros poucos como nós, conseguimos rebater daqui. Quando alguém vende a alma ao demônio isso deixa de ser um problema exclusivamente dele quando esse alguém vai à Caras, à Exame e à Veja para convencer a todos de que vender a alma é o certo.
E o que aconteceu de bom no final de tudo isso? Na minha opinião, várias coisas. A primeira é que muitos agora viram que o que ele diz não é uma verdade. É uma opinião viciada, interesseira e oportunista. E não é a opinião do resto do mercado. Segundo, é que outros que pensam como nós entenderam que ele pode e deve ser confrontado. Terceiro, é que se definiram claramente os discursos e as práticas no dia a dia. Agora, já pode-se começar a entender que mediocridade e mesmice são apenas uma opção e, tanto são uma opção, que têm um lugar (ou um grupo) certo onde podem ser solicitadas. Mas existem sim outras opções e nós estamos na ponta entre as agencias de propaganda lato-sensu que oferecem essa opção. Quarto, é que sempre é bom ver os que se fazem de bonzinhos e corretos finalmente mostrando as suas garras e suas verdadeiras motivações. Naquele mesmo dia à tarde o Nizan me telefonou aqui na agencia. Como eu não o atendi, deixou, literalmente, o seguinte recado com a Sueli: "Diga ao Fábio que ele é viado, frouxo, que ele me bate em público mas se ele for homem que telefone para mim!" Disse também, mais tarde, em um jantar com pessoas que me conhecem que "Eu só não bati em Fábio Fernandes porque ele estava maquiado - e eu não bato em homem maquiado". Para os que não entenderam o enigma (como eu, que fui perguntar a uma pessoa que o conhece) ele acha que eu... passo lápis nos olhos. Sim, acreditem. Alguém, inclusive, já o ouviu relatando que alguém lhe contou que uma certa vez, sob a chuva, o lápis dos meus olhos borrou e eu corri para colocar os óculos escuros.... :-))))) Inacreditável, mas é a mais pura verdade. Foi a esse ponto que esse sujeito chegou.
Por isso mesmo eu resolvi escrever a todos vocês sobre isso. Porque o que eu tenho a dizer sobre ele é bem pior do que seria se ele apenas usasse lápis para ressaltar os seus lindos olhos. O que eu tenho a dizer sobre ele é claro, verdadeiro, profundo e cabal. Fico feliz de não me maquiar, mas não teria problema nenhum em admití-lo se, ainda que absurdo, isso fosse verdade. O duro para ele deve ser ouvir o que eu penso - e que a cada dia mais gente vem me dizer que foi bom eu dizê-lo porque é o que quase todo mundo pensa - e, mesmo sendo a mais aguda verdade, não poder admití-lo. Porque é revelador, comprometedor e devastador.
O rei está nu. E eu sei que ele não é de nada.
Fabio Fernandes
F/NAZCA SAATCHI & SAATCHI
Agency of The Year 1999, 2001, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007.”


Melhor deixar essa baixaria de lado e ouvir em alto volume a banda Fantomas, do ex-vocalista do Faith No More, Mike Patton.