sexta-feira, 2 de março de 2012

Big Cucaracha

Chego de viagem e a geladeira é uma instalação pós-moderna. Vazia. Sem nada para comer e a fome gritando, vou ao lugar mais perto de casa. Não que eu ame muito tudo isso. Pergunto se o tal do Big Tasty é maior do que o Big Mac. Ela diz que é “beeeem maior”. Este é meu único critério para escolher o sanduíche, com fritas e refri grande. Era uma noite quente no verão carioca, pós-carnaval, com as ruas ainda sujas e fedendo a mijo dos foliões mal-educados dos blocos. O ar-condicionado da birosca americana não funcionava. Pronto. Visualizou o inferno? Calma, ainda não chegamos lá. O sanduíche lembra remotamente o da foto no cartaz. E o molho é horroroso. Quantas camadas faltam, Dante? Enquanto como empurrando o bolo alimentar para dentro com fartos goles na Coca, uma super-hiper-ultra-mega-giga barata cascuda, daquelas voadoras, desfila lenta e garbosamente pela parede. Minha proposta de jantar era trash, mas nem tanto.


Chamo o faxineiro para matá-la. O jovem aquiesce com a cabeça, mas para minha surpresa, dirige-se ao depósito e se esconde lá dentro, mantendo a porta entreaberta enquanto observa a barata dona da parede.

Chamo o segurança, digo que pedi ao faxineiro para matá-la, mas zero atitude. O segurança vai falar com o gerente. O segurança volta e diz que o gerente disse que era para o faxineiro matar a barata. Faz sentido. Barata não é bandido, então é da alçada do faxineiro. É uma questão de governança corporativa. O segurança diz que o faxineiro tem medo de barata. Super qualificado para o cargo.

O faxineiro permanece escondido. Chega uma, e depois outra, funcionária para o trabalho. A ambas ele pede ajuda. As duas negam, mas sem nenhuma afetação ou temor excessivo em relação à visitante ilustre. Eu continuo comendo. Corajoso.

O gerente sai detrás do balcão, com vassoura em punho. Atinge a fera voadora e termina o serviço com um segundo golpe sobre a cambaleante besta assassina. O faxineiro, aliviado, sai então de seu bunker, varre o cadáver e sorri amarelo. Em tom desbotado, diferente do M do letreiro luminoso.





23/02/2012 - Avenida Nossa Senhora de Copacabana.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Cena contemporânea

Restaurante do shopping, desses em que se escolhem ingredientes e molho para montar a salada acompanhada de quiche. Executiva loura balzaquiana bonita de bolsa Louis Vuitton mexe ansiosamente em seu smartphone enquanto aguarda a comida. O prato chega, o telefone toca, ela atende. É uma amiga. Ela ouve enquanto mastiga e fala. Quem me conhece sabe o quanto sou curioso. Presto atenção na conversa, naquilo que posso ouvir por conta da distância entre nossas mesas. São palavras e frases picotadas que consigo pegar. Ela menciona o Facebook. Do carinha – namorado, ficante, pretendente, sei lá qual o status. Diz que isso – embora não dê para eu saber o que é “isso” exatamente - é demais para ela, demais para qualquer mulher suportar. Pelo jeito, viu ou leu algo que não gostou. Conversa longamente com a amiga. Pede opinião, conselho. Desabafa. Termina a conversa. Termina a comida. Terminará a relação?