La Bombonera. Foto: Leandro Wirz Sou carioca e flamenguista, dois atributos – ou melhor, duas virtudes – que me tornam marrento. Mas mesmo marrento, sei reconhecer meu lugar. Sou mero aprendiz. Existem marrentos muito mais adoráveis do que eu: Romário, Liam Gallagher, Prince e até o marrento-bufão Túlio Maravilha. E outros mais marrentos, mas nem tão adoráveis: Ed Motta, Nelson Piquet, Edmundo.
Recentemente, fiz a peregrinação à Catedral da Marra. Claro, fica na Argentina. Você conhece povo mais marrento? Se você comprar na Bolsa um argentino por quanto ele vale e conseguir revender pelo valor que ele acha que vale, não há crise econômica mundial. Não há Dow Jones ou Ibovespa que segure. É investimento de lucro certo.
Use seu Google Maps e vá aproximando a imagem. Argentina, Buenos Aires, La Boca, La Bombonera. Chegamos. Ninguém é mais marrento nesse mundo do que um argentino residente no bairro de La Boca e torcedor do Boca Juniors. La Boca é como Belém para os católicos. Deus veio de lá. Pelo menos, o deus deles.
La Bombonera, o estádio do Boca, faz nossos alçapões parecerem hospitaleiros campos neutros. O time visitante já começa perdendo. Enquanto o time da casa entra em campo por uma – com trocadilho – boca grande, o túnel do time de fora é um corredor estreito e opressivo. O gramado tem as menores dimensões oficiais possíveis e as arquibancadas são extremamente verticalizadas, de forma que a torcida fica assustadoramente próxima dos jogadores adversários. E pode ser bastante “amistosa” com os visitantes. É pressão pura. Bafo quente no cangote.
Os boquenses, claro, arrotam que La Bombonera é a catedral do futebol. Visão tão míope e limitada que soa ridícula, ainda que afirmem que Deus se criou lá. Mas a gente alivia porque sabe como esses argentinos são marrentos. La Bombonera é, na verdade, a catedral da marra.
Camisetas à venda nas lojas de souvenires ao redor dão a dimensão da marra: Numa, lia-se “La Republica Popular de La Boca”, elevando o bairro de origem proletária a uma nação. Ora, amigos, nação, para mim, é a rubro-negra. Que tem mais torcedores do que toda a população da Argentina. (Circulando por Buenos Aires, vi uma mulher com uma similar nacional, embora bairrista e não futebolística. Estava escrito: “Nacionalidade:carioca”). Outro exemplo, ainda mais contundente são camisas na linha “Yo vi D10s”, em um trocadilho visual do número 10, de Maradona, com a palavra Díos. Tem uns malucos fundamentalistas que até fundaram uma religião, o Maradonismo, na qual o marrento-mór Diego Armando é O Próprio. Não dá para levar a sério. Eu nunca vi Deus (nem estou com pressa para isso), mas tenho certeza de que ele não tem a cara do Maradona. Pelas imagens que já vi, Deus parece mais com o Zico.
A solidariedade marrenta me faz simpatizar com o Boca Juniors, o time mais popular (nos dois sentidos) de lá, assim como o Flamengo é o daqui. Além disso, seria impossível eu torcer pelo time da elite de lá, o River Plate, apesar do patrocínio da brasileira Petrobras. É que o uniforme do River traz uma faixa diagonal que sobe da direita para a esquerda. As cores são diferentes, mas já pensou se alguém me vê usando isso e pensa que eu sou torcedor de um time cruz-maltino que vai disputar a Segunda Divisão este ano?! Deus me livre. Além disso, a camisa do River traz nas costas, ali bem juntinho da nuca, a frase “El más grande”. Eu, hem! Esses argentinos...
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