quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Sobre homens e tigres


O homem é o animal autointitulado mais inteligente da Terra. Mais inteligente não significa o mais feliz.

É também o bicho mais pretensioso. Tão pretensioso que inventou deus à sua imagem e semelhança, mas, malandra e mercadologicamente, espalhou que foi o contrário. Inverteu criador e criatura, em golpe de falsa modéstia. Assim, ficou mais fácil vender o seu peixe. No caso, seu deus. E é por causa desse bom deus e do vil metal que as guerras têm sido travadas há séculos. “Lembre-se sempre que deus está do lado de quem vai vencer”.

Diante de tantas desigualdades injustificáveis neste mundo de meu deus (ops, de seu deus), o homem inventou que os desígnios desse seu deus são além de nossa compreensão e que se você, meu caro, está tão fodido assim deve ser porque merece. Mas não fica assim, nem tristinho, nem revoltado, não, porque quando você morrer, se tiver se comportado direitinho, você e o carinha que inventou deus e está cheio da grana serão iguais e desfrutarão das maravilhas dos jardins floridos da vida eterna.  Até lá, fica na sua e não enche o saco.  

O homem é tão pretensioso que acha que está no centro do universo, embora habite um planetinha ínfimo em uma galáxia insignificante. E como tem dificuldades em lidar com a sua finitude, encanou que a sua vida tem que continuar em algum lugar melhor.  Melhor para ele e pior para os que não compartilham o mesmo deus. Porque, claro, pretensioso, o homem passou a crer que, por crer em um determinado deus, é individualmente superior ao homem igualzinho sentado ao seu lado no metrô, mas que inventou outro deus qualquer.

O homem é tão pretensioso que não aceita que sua breve passagem por estas bandas seja tão somente cheia de som e fúria significando nada (como escreveu um certo bardo dotado de rara sensatez).  Em sua infinita pretensão, difundiu a ilusão de que se ele, homem, existe é por um propósito maior. E que este é tão incomensuravelmente grande que uma vida inteira é muito pouco. Precisa e merece outra, alhures ou aqui mesmo, em encadernação revista e atualizada.

Tudo isso só pra não se borrar nas calças quando a jiripoca pia ou quando está cara a cara e prestes a ser devorado por um tigre naturalmente nada misericordioso. Que pode não ter sido capaz de inventar a roda, a pólvora, a penicilina, a bomba ou um deus, mas é muito mais bonito que o bicho homem. E quiçá, mais inteligente, porque vive, simplesmente, sem perder tempo pensando na tal felicidade ou inventando histórias pra boi dormir. O tigre vai lá e come o boi. E pronto, tá resolvido

2 comentários:

Inaie disse...

Leandro, achei o texto brilhante!!!! E me lembrei do filme "a invenção da mentira". Você viu? Se não viu, com certeza vale a pena.

Bj que eu vou ali abrir uma igreja pra garantir meu lugar ao sol, no jardim pós vida.

Leandro Wirz disse...

Obrigado, Inaie. Acho que não vi o filme, mas a sugestão está anotada.