Há um par de semanas, me deparei com um livro inevitável: “Então você quer ser escritor?”, contos do paranaense Miguel Sanchez Neto. O título é desafiador, provocativo e, em uma rápida folheada, me certifico que não se trata de volume de dicas e fórmulas inúteis para quem quer brincar de ser escritor.
Sim, eu quero ser escritor. Respondo ao chamado do mundo. Ou do meu mundo. Todo escritor tem mais vida interior do que vida real. Eu quis ser cantor de rock, mas cresci e envelheci, sem a dignidade e a capacidade de continuar a ser ridículo. Eu quis ser ator, mas tive receio e preguiça. Bailarino era a quarta escolha, porque não há uso mais belo e consciente do corpo, mas nunca tive o menor talento para a dança. Sim, eu quero ser escritor, opção terceira em meu rol da infância. (Se é que é opção, visto que para muitos é maldição, um embrenhar-se na solidão).
Li, certa vez, em crônica de Arthur Dapieve, que todo homem de caráter tem suas obsessões. Sobre o caráter podem pairar dúvidas, mas entre minhas obsessões inequívocas estão árvores desfolhadas, galhos secos. Como se fosse sempre inverno ou estivesse no cerrado. Não bastasse o título, então, a capa do livro também era igualmente irrecusável, com a imagem de árvores que parecem emergir (ou estão semi-afogadas) em águas paradas. Peças mortas de resistência vã.
Aproveitei viagens a trabalho durante esta semana para ler no avião que, em alguns trechos, sacudiu não mais que um carro sobre o asfalto vergonhosamente esburacado do Rio.
O livro é de fatias da vida. Personagens sem nobreza, sem grandiosidade em recortes que tangenciam o banal, mas ocultam profundidade, como, talvez, as raízes das árvores da capa. Na maioria das vezes, sem grand finale.
Mas ao final do último conto, que dá título à coletânea, parecia que tinha levado um soco. Um soco bom, se é que isso é possível. Faltou ar e a primeira palavra que me ocorreu foi: estupendo.
Durante a leitura deste conto, pensei muito em um escritor, paranaense como o autor, que tem sido, há década e meia, uma referência para mim. Um homem que me ensinou muito sobre literatura e sobre a vida. Um grande amigo, um irmão mais velho, uma espécie de pai (no bom sentido da palavra). Valeu, Bwana!
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