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terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Solidão atualizada

Almocei na companhia do meu smartphone, que não me acompanhou no chopp. Joguei paciência (que em inglês, chama-se, mui apropriadamente, solitaire), fiz um selfie para postar como estava me divertindo na rede social, onde li notícias suas, tão melhores, de algum lugar distante.

domingo, 5 de agosto de 2012

Ela está ali


São 1h37 da madrugada de domingo e ela, sozinha, fuma e toma lentamente um chopp que esquenta rapidamente num restaurante da orla de Copacabana nessa noite morna sem lua. Tem uns cinquenta e muitos anos e está arrumada, maquiada com algum excesso, brincos grandes, pulseiras douradas, colar de bijoux,  vestido preto, cabelos tingidos de louro pra disfarçar os fios brancos que denunciam a idade. Em vão. Pescoço, pés de galinhas e mãos delatam.  

Faz tempo – uns três anos, pelo menos – que não sabe o que é um homem. E ela queria muito chupar um pau esta noite. E ter mãos firmes que a tocassem com vontade, que lhe trouxessem de volta orgasmos distantes, mas não esquecidos. Não tem sido fácil. Em suas incursões pelo vazio das noites, ela, vez ou outra, conversa com algum solitário. Mas todos têm sido invariavelmente desinteressantes. Grosseiros, quase rudes, barrigudos, calvos, que fazem galanteios diretos demais,  baratos como rosas murchas de vendedores ambulantes. Gente que desanda a falar mal da ex-mulher que lhe tira uma fortuna de pensão e de filhos problemáticos.

Ela mesma sobrevive com a pensão – não uma fortuna – que recebe do ex-marido que lhe deixou por outra, mais jovem, uma divorciada com duas crianças, e com um salário modesto de funcionária pública de quinto escalão da prefeitura. Aluga um pequeno apartamento ali mesmo em Copa em um prédio antigo, feio e mal cuidado. Poderia estar roubando, matando, mas está ali. E esta já é uma piada velha dos vendedores de balas dentro dos ônibus que ela pega diariamente até o Centro.

Ela está ali. Recusa-se a aposentar o desejo.  Nada de acomodar-se diante da televisão, de vestir sandálias baixas da linha Comfort, e cuidar de netos. Até por que sequer teve filhos com o ex-marido.  Compra roupas que emulam elegância e qualidade nas lojas populares escondidas nas galerias do bairro. Não têm bom caimento, mas disfarçam razoavelmente as imperfeições que a idade e a gravidade impõem ao corpo. Ela luta contra, fazendo ginástica numa academia modesta perto de casa.

Ela está ali, olhando o movimento na calçada, a diversificada fauna noturna, àquela altura com interesse pouco maior do que a indiferença  à televisão sem som suspensa no restaurante.  Dado o avançado da hora, pressente sem dificuldade que seu jejum não se encerrará hoje.

Tudo bem, está habituada ao zero a zero.  No próximo fim de semana, estará de volta, com o mesmo fiapo de esperança. Ela só quer, como quase todo mundo, encontrar alguém legal pra ficar. Um coroa bacana que a leve para jantar, para viajar, ao teatro. Um homem gentil.  Ainda haverá algum? Ela está ali. Seu mérito maior é tentar.